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Divulgação científica e protagonismo feminino: 10 anos de ‘’Bate-Papo com Netuno’’

Por Kamila Rocha

— O blog ‘’Bate-Papo com Netuno’’ surgiu como um projeto de extensão da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) — idealizado pela Dra. Catarina Marcolin, docente da instituição e colegas de pós-graduação em 2015 — para tornar a ciência e os ‘’mistérios’’ dos oceanos acessíveis. A iniciativa é pioneira em divulgar ciências do mar de forma voluntária e feita por mulheres. Esse ano o blog completa 10 anos com o lançamento do livro ‘’Tiradas do Netuno’’.

O blog utiliza diversos formatos — como textos, tirinhas e podcasts — para explorar curiosidades e fatos sobre a ciência no ambiente marinho. Além disso, aborda também questões de gênero dentro da academia e o dia a dia e desafios dos cientistas.‘ ’Eu gostaria de escrever as coisas que eu faço na academia, na universidade, para pessoas que não são necessariamente acadêmicas e elas possam compreender o que eu faço aqui’’, explica a co-fundadora do projeto Catarina Marcolin.  

‘’A oceanografia está dentro das ciências exatas e da Terra, são as ciências consideradas mais duras. São áreas que tradicionalmente vêm sendo ocupadas mais por homens. Hoje a gente tem mudado um pouco esse retrato. Nos cursos de graduação de hoje, a gente tem visto bem mais mulheres, mas os professores, por exemplo, os pesquisadores sêniores,ainda são homens em sua maioria’’, aponta a docente. 


Dados do Censo do Ensino Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa (INEP) revelam que, em 13 anos, 56,17% dos formandos em oceanografia são mulheres. Em paralelo, de acordo com dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES), 60% dos titulados como mestres eram mulheres e, no doutorado, 52,21%. Ainda, sim, apenas 36,05% das posições mais elevadas no meio acadêmico são ocupadas por mulheres.

Outros levantamentos, como o do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), demonstram que as mulheres representam cerca de 45% dos pesquisadores com doutorado em Oceanografia no Brasil, mas sua presença diminui em cargos de prestígio: apenas 35% das bolsas de Produtividade em Pesquisa em Ciências do Mar são ocupadas por mulheres.

 ‘’Isso a gente chama de efeito tesoura ou leaky pipeline, que é como se fosse um cano que tem uma goteira. Então na parte mais baixa da carreira, na graduação, tem um monte de mulher, aí, no mestrado, elas vão sendo perdidas ao longo do caminho, no mestrado, você perde um pouquinho. No doutorado, você perde um pouco mais. Aí, você vai olhar professor, menos ainda. Aí, dentro do professor, você pode ser bolsista produtividade. Então, quanto mais sênior, menos mulheres a gente tem‘’, relata Catarina.

 ‘’Quando a gente está o tempo todo tentando e não consegue — você só toma não — tem hora que você se cansa e fala: eu não vou mais tentar. Eu vou ser medíocre. Vou continuar aqui […] Embora eu não seja medíocre como pessoa, eu vou ter que levar uma carreira medíocre, porque eu não consigo recurso para poder fazer minha pesquisa, porque eu tenho uma carga de cuidado gigantesca com minha família e eu não consigo me dedicar ao trabalho, embora eu gostaria. — São muitas questões que atravessam as mulheres, que são totalmente invisíveis para a maioria dos homens’’, explica a docente sobre os desafios enfrentados por mulheres na carreira, e complementa: ‘’Para ser pesquisadora no Brasil, você tem que ser muito resiliente’’.

‘’Ser mulher na ciência é desafiador’’, afirma Camila Ribeiro, que está no quinto semestre de oceanologia. A graduanda faz parte do Laboratório de Estudos Planctônicos e Divulgação Científica (LEPLAD). A estudante relembra sua experiência com o primeiro embarque e conta sua surpresa ao chegar no navio e ver que quem liderava era uma mulher e o restante da tripulação era majoritariamente masculina:

‘’Eu fiquei pensando, como deve ser para ela? Como ela se sente? E, ao mesmo tempo, fiquei maravilhada’’.

’’Quando a gente coloca as mulheres em evidência, a gente já está quebrando o estereótipo de gênero’’, enfatiza Catarina. Projetos como o ‘’Bate Papo com Netuno’’ ajudam a quebra de estereótipos sobre a imagem de quem faz ciência.‘’Ter a presença de outras mulheres no ambiente de pesquisa é essencial — eu digo isso por experiência própria — porque gera representatividade e inspira’’, acrescenta Camila.

A partir de denúncias recebidas no blog, foi desenvolvida uma pesquisa de mestrado sobre o assédio sofrido nas embarcações. O estudo revelou que 82% das mulheres que já embarcaram sofreram algum tipo de abuso. ‘’A criação dessa pesquisa e a divulgação dela nas redes trouxe um debate muito forte sobre o que é ser mulher nas ciências do mar. As violências a que a gente pode estar sujeitas e a criar estratégias de prevenção […] O Bate Papo com Netuno ajuda a criar essa rede de sororidade’’, destaca a co-fundadora do projeto.

O livro ‘’Tiradas do Netuno’’ traz uma coletânea de tirinhas baseadas nos textos publicados no site. O lançamento foi no dia 7 de agosto, durante o evento realizado no Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP) em comemoração aos 10 anos do projeto.

O blog está disponível em: www.batepapocomnetuno.com e nas redes sociais como @batepapocomnetuno. Para colaborar com o projeto e com a divulgação das ciências do mar, é necessário entrar em contato pelo e-mail batepapocomnetuno@gmail.com ou pelas redes sociais.

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